‘Faça Ela Voltar’ trata de luto sem se esquecer que, acima de tudo, é um terror

 ‘Faça Ela Voltar’ trata de luto sem se esquecer que, acima de tudo, é um terror

Faça Ela Voltar trata de luto sem se esquecer que, acima de tudo, é um terror; leia a crítica – Divulgação/Sony Pictures

O terror contemporâneo vem explorando o luto como motor narrativo há algum tempo. Filmes como O Babadook (2014) e Hereditário (2018) usam a perda pessoal para justificar a presença do mal, mas muitas vezes deixam o gênero refém do drama psicológico, transformando o medo em mera ilustração de traumas.

Faça Ela Voltar, novo longa dos irmãos Danny e Michael Philippou (Fale Comigo), parte do mesmo ponto de partida — personagens esmagados pelo luto —, mas não se prende a ele. O filme abraça a dor da perda sem abrir mão do terror cru, gráfico e perturbador, mantendo o espectador em constante estado de tensão.

Trama e personagens

A história acompanha os irmãos Andy (Billy Barratt) e Piper (Sora Wong), que, após a morte do pai, passam a viver sob a tutela da excêntrica Laura (Sally Hawkins). Na casa isolada, eles conhecem Ollie (Jonah Wren Phillips), um novo “irmão” cuja presença carrega mistério e ameaça desde o primeiro instante.

O elenco dá peso emocional à narrativa: Hawkins constrói uma Laura que oscila entre simpatia e desespero, transformando-se em uma figura perturbadora que se recusa a lidar com o luto. Barratt e Wong conferem profundidade e cumplicidade aos órfãos, enquanto Phillips transforma Ollie em presença física inquietante, garantindo algumas das cenas mais aflitivas do filme.

O terror além da perda

Cada personagem lida com a ausência de entes queridos: Andy e Piper sofrem a falta do pai, Laura busca preencher o vazio deixado pela filha morta. Mas o filme não se limita a isso. Mostra que atos de amor podem se tornar fontes de horror, e que o vazio emocional é tão ameaçador quanto a violência explícita que explode na tela.

O desconforto não vem apenas das imagens, mas do que o público sente junto com os personagens — uma dimensão emocional que outros lançamentos deste ano, como Juntos, não conseguem atingir. Comparações com A Hora do Mal são inevitáveis, já que ambos lidam com múltiplos personagens, mas o filme dos Philippou se destaca pela montagem eficiente, ritmo constante e desenvolvimento dos protagonistas, mantendo a tensão sem recorrer a exposições excessivas.

Simbolismo e mistério

Faça Ela Voltar evita explicar demais. A água, a chuva, a piscina vazia, as fitas VHS e a palavra de segurança entre os irmãos são símbolos que o público precisa decifrar. Ao se recusar a fornecer respostas prontas, os Philippou confiam na audiência e permitem que cada espectador monte seu próprio quebra-cabeça psicológico — um alívio em um gênero muitas vezes didático demais.

Conclusão

Violento, melancólico e emocionalmente exaustivo, o filme prova que o terror pode ser tanto gráfico quanto psicológico, duas faces de uma mesma moeda. Faça Ela Voltar reafirma a habilidade dos Philippou em manter o espectador em tensão, lembrando que, às vezes, o maior monstro é o próprio luto, e a aceitação é o ritual mais difícil — e talvez necessário — para sobreviver a ele.